quinta-feira, 18 de agosto de 2011

João e Maria – Terror



Em meio ao barulho atordoante da floresta, uma simples casa resistia a maldição do inverno rigoroso e da fome avassaladora. Dentro desta velha casa, residia uma pobre mãe e seu casal de filhos miúdos, João e Maria. O pai havia morrido de cólera durante a primavera, seu corpo foi enterrado embaixo de uma das arvores da floresta, próximo a casa tosca.

A pobre mãe que guardava o que podia para alimentar os pequenos na tenebrosa neve de meses, se via quase que sem nada, pronta a se entregar ao frio braço da morte. João tinha apenas 12 anos, mas vasculhava a floresta em busca de animais mortos para alimentar a pequena irmã Maria e a mãe, mas raramente tinha sucesso em sua busca.


Certa vez a mãe enxergou um vulto ao alto da montanha. Era um homem cansado, segurando em uma das mãos um veado abatido e destrinchado, e em outra mão uma grossa espingarda. Trajava roupas de soldado e caminhava ferido, em meio a neve e aos galhos secos. Ela correu até ele e o sentiu desmaiar em seus braços, o levou para casa e limpou seus ferimentos de guerra.

O homem acordou com o cheiro de uma sopa... As crianças vorazes comiam a mesa, enquanto o ouviam contar sua história:

Eramos em 112 contra as tropas do rei George. Em meio a balaços e cabeças decapitadas, me banhei do sangue de meus companheiros e fui jogado na valeta, junto com os mortos. Antes que ateassem fogo, me arrastei até o lago e fugi. Vaguei a 93 dias por esta floresta fria, até encontrar sua ajuda, boa senhora.

O soldado bebeu da sopa e olhou João e Maria, apreciarem da carne do veado.

É preciso comer apenas o necessário – Advertiu – Este inverno durara mais um mês e tanto...

A mãe arrancou os pratos da mesa e guardou a carne, o soldado adormeceu e as crianças foram brincar lá fora


Seis meses correram ligeiro. João corria em desespero pela floresta densa... Seu coração pequeno disparava diante a perseguição, ele parou diante uma arvore e sentiu uma corda suja enrolar seu pescoço:

Moleque desgraçado! Acha que pode fujir de suas obrigações assim?

Era o soldado, agora na condição de seu padrasto. João foi empurrado no chão, e com medo, tentava fujir de mais uma surra violenta... A corda enlaçou seus pés pequeno, o padrasto atirou a outra ponta da corda sobre um galho alto e a puxou, arrastando João até pendura-lo de ponta cabeça. O pobre menino gritava em desespero, indefeso, enquanto o homem voraz o chicoteava com a outra ponta da corda:

Moleque vadio! Você vai fazer o que eu mandar! O que eu mandar! Você entendeu seu merdinha?

Maria e a mãe chegaram desesperadas e viram o menino pendurado, com vergões pela face nua. A mãe se ajoelhou diante os pés de seu homem, ele a empurrou e babando indagou:

Ele precisa aprender! Precisa aprender o que é ser um homem de verdade!

Após o odioso episódio, João carregava a lenha e a empilhava atrás da casa, tremendo e com o corpo tilintando de dor.

Maria costurava com a mãe os couros da caça do padrasto. Eram meses muito bons e toda a carne foi estocada em um comodo fora da casa, construído por João e o carrasco.


O tempo corria e mais uma vez o inverno rigoroso se aproximara. João escondido em cima de uma arvore mirava cauteloso a espingarda para um gordo Javali. Do outro galho ouvia as instruções:

Olhe para ele, João... Olha bem para ele... É grande não? Vai nos garantir boa refeição durante o inverno odioso. Mire certeiro, João! Mire na cabeça e atire sem pesar... Atire para matar, não deixe que ele fuja... Se isso acontecer, teremos que nos contentar apenas com a carne seca armazenada na estocagem.

João respirava fundo e com medo mirava, temendo errar e ser surrado:

Acerta ele João... Acerte na cabeça... Não de chances dele fujir! Acerte agora!

Um tiro ecoou pela floresta que começava a ficar fria. Os pássaros que migravam para o norte voaram mais rápidos... O javali grunhiu ao ser alvejado e correu sangrando por entre as arvores que perdiam as folhas.

O padrasto pulou no galho em que João estava, tomou a espingarda de sua mão e deu uma coronhada em sua testa. O pobre menino despencou a quatro metros de altura, caiu de olhos abertos e os fechou desmaiando. O homem escarrou em cima dele e bradou:

Falei para não errar, seu filho da puta!

Era tarde da noite quando o menino acordou com a testa enfaixada por um pano velho. Se levantou ainda tonto pela pancada, escutando um barulho selvagem vindo do quarto da mãe. Olhou para o lado e viu o grande Javali abatido, pendurado pela mesma corda que o surrava, a barriga aberta, limpo, sem nenhum dos órgãos internos. João caminhou descalço até o quarto da mãe, e a viu sendo possuída com violência pelo padrasto.

A cabeça da mulher era pressionada contra a cama dura, enquanto ele a invadia como um animal, batendo em suas nádegas roxas com a outra mão. O ex-soldado, sem parar o ato, o olhou e ordenou:

Vá para o seu quarto, pivete de merda!

João se afastou e dormiu com dificuldade, pensando em toda a barbarie que havia começado em sua vida desde a chegada do homem sujo..


Na manhã seguinte o homem embaixo da arvore chamou Maria. A menina veio correndo. Ele apontou para o chão e perguntou:

Quem esta enterrado aqui?

Era a cova de seu pai. Maria olhou para os lados, se lembrou da mãe e da ordem que recebeu para não contar sobre a cova. Ela tremia, tentando esconder a verdade. O homem segurou com a mão forte seu queixo, o apertou e perguntou novamente:

Vamos lá, responda Maria: Quem esta enterrado aqui?

Ela diante a dor, olhou em seu rosto e confessou:

Pa-Papai...

O homem a soltou. Maria passou as mãozinha no queixo ferido e o ouviu dizer:

Quero que o desenterre. O desenterre e se livre dos ossos. Não quero o ex de minha mulher enterrado em meu quintal! Faça até o entardecer.

João sentado com o padrasto, via a irmã sofrendo para desenterrar o pai da terra seca e gelada. O ex-soldado o olhava curioso. Por fim falou:

Você quer ir até lá ajuda-lá, não quer João?

O menino consentiu com a cabeça. O padrasto sorriu com seus dentes amarelos. Acendeu um paieiro de fumo e falou:

Você parece ter pena das mulheres. Não deveria. A Maria é preguiçosa, fazemos todo o trabalho enquanto ela só come e engorda. Não deveria ter pena das mulheres, João. Elas são bem pra isto mesmo, para nos serem uteis, na cama, na cozinha ou até mesmo no quintal desenterrando velhos defuntos.

João o olhou raivoso:

Viu como eu fodi sua mãe? Você pode até não acreditar, mas ela bem gosta de tudo aquilo João. E quando a Maria crescer mais, farei o mesmo com ela... E quer saber? Ela herdou a subimissão de sua mãe... Acho que gostara, assim como ela.

João nervoso pulou em cima do padrasto. O homem ria enquanto o dominava facilmente e continuava a dizer:

Não fique tão brabo, João... Isso ainda vai demorar alguns anos... Até lá você vai ter a chance de defende-la. Porque agora você não passa de um pirralhinho ranhento e fraco.

O homem grotesco o empurrou no chão e saiu, rindo de toda a desgraça do menino, enquanto Maria batia a p´´a, tirando aos poucos a terra congelada..


Maria enfim arrancou todos os ossos do pai da terra e os colocou em um saco velho. Já era tarde, estava quase que escurecendo quando ela caminhou com ele até a estrada do antigo cemitério, aonde repousavam os restos de seus avós.

Era noite quando ela entrou na casa tosca, toda suja de terra. Os três comiam sopa a mesa. O padrasto parou de comer e lhe falou:

Chegou cedo, Maria. Tenho minhas duvidas se realmente deixou os ossos velhos de seu pai no cemitério.

Maria nada respondeu. Ele a chamou. Ela toda suja se aproximou dele. João parou de comer e os olhou assustado:

Você é uma boa menina – Disse ele alisando seu rosto que havia ferido – Sabes que sempre vai poder contar comigo, mas nunca mais esconda nada de mim. Agora vai se banhar. Você esta fedendo.

Sim, papai – Respondeu Maria, provando a João que era tão submissa quanto a mãe.

A menina foi até o fogo e pegou a agua quente. João encarou o padrasto que sorriu e bradou:

Como tudo pirralho. Você precisa ficar forte... Precisa crescer forte pra um dia poder cuidar melhor da sua irmãzinha!

Naquela noite, João não conseguia dormir com o insuportável barulho do padrasto violentando sua mãe. Ele que não podia se defender, tremia de dar pena, até pegar no sono.

Na manhã seguinte ela apareceu com os olhos roxos, enquanto o padrasto limpava a arma de caça:

Hoje é o ultimo dia, João – Disse ele, extremamente dedicado a arma – O ultimo dia para se caçar... Amanhã o inverno virá com tudo, avassalador, nos privando de qualquer chance de caçar nos próximos 90 ou 100 dias. Mas não se preocupe se nada acharmos hoje. Nosso estoque esta cheio, sobreviveremos a este inverno.


Os dois vagavam pelo frio que já invadia a imensa floresta. O padrasto ia na frente, e João logo atrás... A neve fina dava o primeiro sinal, João o seguia com atenção, ele parou e sorriu, apontando a arma para três lobos cinzentos ao longe, que devoravam um veado recém abatido:

Consegue vê-los, João?

Sim...

Olhe com atenção, pirralho... Três lobos cinzentos, famintos.

Vai mata-los? – Perguntou o menino curioso.

O homem abaixou a arma e sorriu respondendo:

É claro que não seu moleque. E você sabe porque? Porque eles são como nós... São caçadores, predadores que só querem sobreviver ao caos da natureza. Não merecem morrer, não pelas nossas mãos. Talvez pela de Deus.

Poderíamos mata-los, ou ao menos afugenta-los e pegar a caça que conseguiram...

O padrasto alisou a cabeça de João e sorrindo forçado perguntou:

Você não aprendeu nada, não é menino? Não posso mata-los, porque eles são como nós. É da natureza deles sobreviverem, e eles o farão a qualquer custo. Vamos deixa-los e voltar pra casa. Como eu te disse antes, temos o bastante, e parece que eles não. Mas eles acharam um jeito de sobreviver.

João o seguiu, percebendo ali que ele não era tão tolo.


O frio intenso devorou de vez toda a floresta. João tentava pensar em um jeito de se livrar de seu padrasto, enquanto as folhas resistentes se entregavam a geada dura. Os dias correram e viraram semanas, e em uma noite tranqüila, João ouviu um barulho vindo da estocagem. Se levantou assustado e constatou o pior... As grossas tabuas haviam sido ruidas e ele enxergou um rabo cinza:

Lobos!

João correu para o quarto do padrasto e o avisou... Os dois desesperados foram até a estocagem... Os três lobos que a tudo devoravam, foram confrontados pelos dois. O menino João desarmado, foi atacado por um lobo cinza... O padrasto em posse da arma, disparou contra o cranio do lobo velho, o derrubando ainda no ar, próximo a jugular de João.

O homem nervoso disparou contra os outros dois lobos, mas os mesmos fugiram em espetacular fuga, ainda arrastando a carne seca... João olhou a estocagem devorada e lamentou.

O inverno rigoroso seguia... Os pratos com pouca comida denunciavam a extrema escassez. O padrasto revirava a floresta atrás de comida e dos lobos, enquanto João construía armadilhas em meio a floresta congelada.

Um dia a esposa do ex-soldado procurava lenha para cozinhar ossos, quanto um estranho homem surgiu dos montes. Tinha carne seca pendurada na cinta... Ela o encarou e o ouviu dizer:

Não tema, mulher. Busco por um antigo comandante. Um maldito desertor que deixou uma batalha pelo meio, facilitando a vitória do inimigo. Um vendedor de munições disse que um homem vestido de soldado trocava carne por balas, e que residia por aqui.

A mulher o olhou raivosa e indagou:

Meu esposo é caçador. Achou um soldado defunto já em decomposição... Arrancou suas roupas e jogou o cadáver no rio gelado. Talvez seja o soldado que procura.

O homem bebeu um gole de wyskey e sorriu banguelo:

Talvez seja... Mas aquele não é o tipo de homem que se morre fácil não, dona... Fui encarregado de leva-lo vivo ou morto... Não quero ter que revirar o lago congelado. Minha esperança é que a senhora esteja mentindo para mim.

A mulher se calou. Ele continuou a dizer:

Sei que é difícil, dona... Talvez a senhora tenha se apegado a ele. Ficarei acampado próximo ao tal lago nos próximos três dias... Como eu já lhe disse, ele está congelado, não posso mergulhar para encontrar a ossada. Nem é por isto que ficarei lá. Ficarei até a senhora decidir entrega-lo a mim.

O homem saiu. A mulher pensativa tratou de esquece-lo.

O marido chegou mais uma vez de mãos vazias. A fome o fez ainda mais louco... Ele olhou para as panelas limpas e foi ao quarto. A mulher foi atrás, arrancando a roupa e se deitando ao seu lado. Ele a ignorou e de olhos abertos condenou:

Temos que mata-lo.

Ela arregalou os olhos:

Matar quem homem?

O grotesco sorriu:

Matar o João... É o único jeito. Ou fazemos, ou morremos de fome!

A mulher se calou e tentou dormir... Sabia que ele faria, pois estava bem decidido... Não arrancaria aquela idéia suja da cabeça.


Pela manhã ela o acordou com chá de cidreira. O olhou nos olhos e disse:

Eu faço.

Ele sorriu diante sua coragem e perguntou:

Fará?

Sim... Levo os dois em meio a floresta e os sacrifico.

Não – Disse ele nervoso – A menina não! Eu a desejo!

A mãe indignada lamentou... Olhou para o marido e implorou:

Piedade... Matemos os dois, não precisa dela... Não a nada que ela poderia fazer por você que eu não faça melhor... A carne deles pode nos deixar vivos ao longo de todo o inverno...

O homem sorriu, concordando.

Maria escondida a tudo ouviu... Correu ao quintal, onde João vistoriava as armadilhas vazias... Ela respirou fundo e contou:

A mamãe... A mamãe e o papai estão...

Ei – Interrompeu João – Aquele desgraçado não é nosso pai. Sei que você cresceu um pouco aos cuidados dele, mas nosso pai é aquele que você levou os ossos ao cemitério.

Maria concordou... Se acalmou e contou:

Eles planejam nos devorar... Mamãe nos levará a floresta e nos assassinará... Ela concordou com ele... Nos matará e levara nossa carne para a nova estocagem!

João a olhou e a acalmou:

Mamãe jamais faria isto...

Ela fará João. Fará sim... Você acredite ou não.

A mulher chegou com um saco na mão. Os chamou para ir até a floresta. Os dois pequenos se olharam e Maria alertou:

Vai ser agora João...

Pegaram a estrada rumo ao cemitério. No meio do caminho, Maria parou diante uma grande arvore, pegando um grande saco:

São os ossos do papai... Não tive coragem de leva-los até o cemitério João... Se eu for morta, quero estar junto dele!

João a olhou e se lembrou do que o padrasto lhe disse:

A Maria é preguiçosa, fazemos todo o trabalho enquanto ela só come e engorda. Não deveria ter pena das mulheres, João...

Infelizmente o desgraçado estava certo, Maria não teve coragem para sepultar os ossos do pai e os deixou escondidos a sombra de uma arvore velha.

Quase chegando ao cemitério, a mulher parou diante um novo atalho e anunciou:

Vamos para o lago, crianças...

Eles a seguiram, logo avistaram uma pequena tenda verde. A mulher se aproximou. O homem que dormia acordou e a recepcionou. As crianças famintas o olharam, ele arrancou os filetes de carne da cintura e jogou a elas. A mulher o olhou, arrancou a espingarda de dentro do saco e contou:

Esta é a arma dele.

O homem sorriu. Se aproximou cauteloso. A mulher mirou a arma em sua cabeça e indagou, antes de atirar:

Não vou deixar você arranca-lo de mim!

O tiro ecoou em meio as arvores secas e geladas... O homem caiu com um buraco no cranio. A mulher jogou duas facas da bolsa e as deu a João e Maria:

Descarnem o desgraçado. Vou levar os pedaços dele!

João e Maria obedeceram... Retalharam todo o homem, colocando a carne no grande saco. Diante apenas dos ossos e as tripas, olharam para a mãe, que os abraçou e ordenou:

Ele carrega carne seca . Peguem ela e fujam para a floresta... Voltarei para casa e direi que esta carne é de vocês... João, cuide da sua irmã e não voltem nunca mais... Se voltarem, ele matará vocês... Me escute meu querido... Faça o que mando e vocês sobreviveram!

João obedeceu. Pegou as carnes secas estocadas pelo homem e adentrou na floresta com Maria.

A mãe abraçou a grande sacola com a carne do morto e a levou pro barraco tosco.

João cortava por entre os galhos secos, adentrando com a pequena Maria cada vez mais nas profundezas da floresta... Parou e sugeriu:

Maria, pegue os ossos do papai. Jogue-os ao longo de nossa jornada, para que possamos voltar, caso a carne acabe e passemos fome... Poderemos voltar pra casa e confrontar nosso padrasto, será melhor enfrenta-lo mais tarde do que confrontar a morte!

Maria concordou e obedeceu, invadiram o caminho desconhecido, enquanto Maria atirava os ossos do pai pela nova trilha.


Enquanto vagavam, roíam a carne velha, invadindo a floresta cada vez mais, sem nada encontrarem. Quando a noite se aproximava, paravam e acendiam a fogueira. Maria mastigava o tempo todo... João tomou a carne de sua mão e indagou feroz:

Não como tudo Maria! Só o pai do céu sabe quando encontraremos alguma coisa... Estamos vagando a dias, talvez a semanas...

Maria ameaçou chorar. O dia raiava, João juntou as coisas e novamente caminhou, racionando a carne para durar o mais tempo possível.

Semanas se passaram. Maria já muito magra, mastigou sozinha o ultimo filete de carne. João a olhou e disse desanimado:

Temos que voltar... Temos que voltar pra casa!

A fé abandonou de vez o coração do menino. Seguiram então a trilha de ossos... João sabia que estava a semanas longe de seu lar, mas também sabia que se desanimasse, se entregaria morte e morreria ali mesmo, em meio ao gelo.

Então avistaram próximo ao fêmur do pai dois lobos selvagens o roendo... João olhou assustado e os espantou. Os lobos ao longe rangeram os dentes, João então não teve duvidas, eram os dois lobos que invadiram a estocagem. Os cinzentos estavam cada vez mais próximos deles... João corajoso se armou com um pau pontiagudo, o lobo pulou em um galho de arvore, o encarou feroz e disse pronto a atacar:

Esta muito longe de casa, menino...

João delirava pela fome... Se espantou por ouvir o lobo lhe falar. Maria não ouvia, com medo se escondia atrás do irmão.

O outro lobo feroz correu em sua direção. João raivoso fechou os dentes e se preparou. O lobo de cima da arvore olhou paciente... João arremessou o pau pontiagudo, atingindo em cheio no coração do lobo...

O outro de cima da arvore uivou... João se aproximou do lobo abatido, arrancou o pau de seu peito e se voltou ao outro, que raivoso bradou:

Você matou minha irmã, João... É até justo... Mas não se engane, seu padrasto estava certo... Somos iguais, e vai chegar a hora em que farei o mesmo com você!

João se aproximou da loba abatida... A abriu e limpou. Olhou para a irmã e disse:

Agora temos carne para terminar de cumprir com o inverno. Vamos continuar o caminho que estávamos, pois o de volta pra casa esta perdido.

Os irmãos seguiam, o lobo cinzento ia atrás, distante. João parou, arrancou um pedaço da loba e atirou a ele. Ele a devorou aos poucos, sem tirar os olhos do menino...

Ao longo do caminho João comia, alimentava a irmã e o lobo cinzento... O inverno acabou junto com a carne. O esperto menino fez novas armadilhas e agora conseguia se alimentar e seguir sempre em frente. O lobo ainda os seguiam, João sempre o alimentava, era este seu novo habito.


Depois de outros tantos meses e dias, João chegou até uma longa estrada que dividia a floresta que estava de uma outra. João olhou assustado a nova floresta, de arvores muito diferentes das que conhecia. O lobo parou de longe. João olhou para Maria e indagou:

Poderemos decidir: Ou entramos na floresta ou seguimos este caminho para um dos lados.

Maria o olhou e opinou:

O mundo esta em guerra, João... Pode ser que se seguirmos a estrada, cheguemos a uma cidade arrasada e dominada por soldados. Agora se adentrarmos na floresta, poderemos encontrar um pacifico vilarejo. Melhor enfrentarmos o que já conhecemos do que nos aventurarmos contra homens armados.

João a ouviu, e entraram em meio a mata fechada. O lobo parou de segui-los, como que se soubesse o que tinha lá dentro... Não queria enfrentar, e voltou para trás, em busca de sua própria jornada.

Maria corria em meio ao desconhecido, enquanto mascava a carne da caça fresca, se deliciava estasiada, lambendo os dedos gordos, feliz por buscar vida nova.

João avistou uma bela casa em meio ao nada, com quintal limpo, carregado de arvores frutíferas. Uma grande hortas bem irrigada corria próximo a casa, e em um cercado porcos, coelhos e galinhas eram mantidos limpos e bem cuidados. João nunca havia visto aquilo, sequer conhecia alguns daqueles bichos e frutas... Correu com Maria até a propriedade e juntos desfrutaram de todos os prazeres mostrados pelo lugar.

De dentro da casa uma senhora ouviu o atordoante barulho de sua matilha de cães... João e Maria ignorava o rosnar das feras e subiam nos pés de fruta, se deliciando com os sabores que para eles eram total novidade. A Senhora saiu munida com uma vassoura e ralhou aos meninos:

Vermes imundos, sujos e empesteados! Como ousam invadir meu lar?

João desceu as pressas do pé de manga e se defendeu:

Me desculpe, minha senhora... A principio nos pareceu tentador... Nunca vimos tamanha fartura. Estávamos perdidos, viemos de muito longe e por conveniência entramos aqui e encontramos essa maravilha. Não nos julgue por este ato insolente, somos humildes e pobres, o que a senhora tem nos pareceu boa sombra e optamos por apreciar...

Sem mais desculpas, fedelho imundo – Interrompeu a mulher raivosa – Minha propriedade não é local de balburdia, tampouco de deguste a fedelhos sujos. Estranho como meus cães apenas ralharam e não devoraram seus ossos fracos! Pelo menos é o que fazem a invasores!

João baixou a cabeça e humilde falou:

Eu converso com cães e lobos, senhora... Eu os escuto e eles me escutam. Não ousam me atacar. Não é a toa que atravessamos uma densa floresta gelada, enfrentando tais criaturas.

A senhora sorriu:

Lobos não ousam adentrar em minha floresta, agora os cães protegem minha propriedade da invasão de soldados, que vem mapear o lugar... Não entendo o prazer que os homens sentem em desbrava o desconhecido... Meus bichos já destrincharam dezenas deles... A guerra é longe daqui, mas eles se espalham pelo mundo... São como pragas... Insetos sujos que matam em nome de seu Deus.

A senhora olhou para a outra arvore, olhou com atenção para a menina que devorava sem parar uma grande e madura jaca:

Aquela fofinha é sua irmã, meu jovem?

Sim minha senhora. Seu nome é Maria, como eu enfrentou a fome e os lobos. Não vamos mais incomoda-la, sairemos de sua floresta e iremos para a cidade, em busca de um abrigo.

A senhora riu desgraçadamente. Maria desceu da arvore satisfeita, abraçou João e viu a mulher entre gargalhadas perguntar:

Quantos anos tens, menino?

Treze, senhora... Estou próximo dos catorze.

Ela alisou os cabelos de João e lhe contou:

São tempos sujos de guerra, meu jovem... Não há lugar melhor que aqui! Muito me interessei pelo fato de você conversar com caninos... É um dom louvável e seria tolice de minha parte não apreciá-lo – A mulher se aproximou mais de João, que mostrava um busto forte e características firmes de um saudável adolescente. Ela correu o dedo em seu ombro e propôs – Você e a bolotinha de carne podem ficar, podem apreciar do conforto e da fartura de minha propriedade. Em troca, peço que adestre meus cães, que os ensine a ser mais eficazes, mais cruéis e objetivos... Como viu, não são de tanta valia, já que você e sua irmã facilmente entraram em meus domínios. Você aceita, meu jovem?

João sorriu diante a ótima proposta. Maria olhou a sua volta, toda aquela fartura. Se voltou ao irmão e o ouviu responder:

Passamos por tempos difíceis, minha senhora. O conforto de seu lar será como uma recompensa a todas as adversidades que nos corrompeu. Eu aceito ficar e adestrar seus cães.

A mulher sorriu se apertando as duas mãos. Maria correu pelo vasto quintal, enquanto João tratou de ser apresentado a matilha de cães, que eram num total de doze.


Mais de um ano se passou desde a chegada de João a propriedade da estranha mulher, que mais tarde ele foi chamar pelo nome de Efênia.

João aos 16 anos, estava próximo a uma montanha, no gélido frio. De lá tinha total visão da outra floresta, a floresta congelada onde ele há tempos havia passado fome junto com a irmã. Olhou a sua volta, no bom lugar com um clima mais favorável a caça e sorriu. Olhou então ao longe... Três homens fardados, caminhando em sua direção. João munido apenas com uma lança bem trabalhada, não demonstrou medo... Os homens sacaram suas armas e o cercaram, seguros de sua dominação:

Ora, ora – Disse um deles – Vagamos a semanas nesta mata fechada, finalmente achamos viva alma.

João o entendeu, mas nada respondeu. O homem largou a arma, os outros dois miraram as suas com mais atenção, enquanto o companheiro desarmado arrancou uma bíblia da mochila e perguntou a João:

Você é convertido, menino? È convertido na palavra de nosso senhor?

João foi rude:

Não creio em seu deus perverso.

O soldado sorriu e voltou com a bíblia na mochila. Sorriu aos companheiros e calmo falou:

Neste caso... Te sentencio a morte. A morte imediata.

João sorriu calmo... Os homens prontos a atirar. O outro o olhou e disse antes de ordenar:

Que Deus tenha piedade de seu espirito sujo, garoto.

João assoviou... O assovio atordoante ecoou pela mata e logo os selvagens cães rodearam os soldados. Eles demonstram medo, sendo cercados pela matilha que babava ódio, só esperando pela ordem de João:

São cães adestrados – Disse ele aos homens – Eu pessoalmente os ensinei a mastigar soldados. Devem saber que ao longo dos anos alguns de seus companheiros vieram aqui e se perderam na mata. Não tiveram sorte, este aqui não é lugar pra nenhum de vocês. Vou lhes dizer o que vai acontecer: Não importa o que façam, meus cães avançaram em vocês antes que aproximem o dedo do gatilho. São animais sensíveis, percebem qualquer movimento e ou pensamento de maldade... Vocês estão condenados, meus amigos... E espero que seu deus tenha piedade por suas almas assassinas.

João assoviou de novo... Os cães raivosos avançaram selvagemente contra os soldados, que tiveram a chance de atirar apenas uma vez, fatalmente errando o alvo. João sorriu vendo os homens sendo destroçados pelas mandíbulas dos cães famintos, então, gritou alto:

Não comam os corações! Os levarei a Efênia!

Efênia recepcionou João com um bom prato a mesa. Maria na cabeceira devorava um leitão assado... Estava ainda mais gorda e toda segura de sua gana em comer. João a olhou com desprezo, segurou na mão da mulher e falou:

Lhe trouxe corações de soldados. Estavam mapeando a região quando os encontrei.

A velha abriu a caixa com os três corações e sorriu satisfeita:

Você é um bom garoto, João... Tornou meus dias mais felizes desde que apareceu aqui.

Efênia segurou na mão do garoto e o arrastou para o quarto... Maria distraída, comia desvairada, sem nada perceber.

Enquanto fazia sexo com a mulher, João lembrava de tudo que seu padrasto lhe disse e lhe ensinou... Tratava selvagemente Efênia na cama, e ela gostava... João a humilhava em seus caprichos, como via o padrasto fazer com a mãe, e estranhamente percebeu que ela sentia ainda mais prazer... Ele apesar da disposição, de gozar dos prazeres da juventude, não gostava de invadir aquele corpo velho... Mas sabia que era conveniente satisfazer os caprichos curtos da senhora, que lhe era tão bondosa.


Certa vez ela pediu que João construísse um forno maior no quintal. Quando o rapaz perguntou porque, ela responde:

Meu menino... Sinto em lhe dizer, mas Maria é muito troncha, não passa de um fardo sujo, fardo este que eu e você estamos cansados de carregar. Proponho que a cozinhemos, após o inverno.

João ficou pensativo...Maria era a única lembrança da família que ele tinha. Pensou e de tanto pensar, optou por construir o grande forno.

O inverno corria rápido, e enquanto concluía o forno, pensava na mãe. Será que ela ainda estava viva? Pensou no padrasto, naquele homem rude que fazia de tudo para sobreviver... Viu a irmã brincando com os coelhinhos e sorriu... Teria coragem de cozinhá-la? Talvez não teria...

Olhou para a matilha de Cães que dormiam. Os doze ferozes despertaram com seu assovio. João então perguntou:

São fiéis a mim? São de acordo com todas as decisões que eu tomar?

Os cães pareceram concordar com João. Ele olhou toda a propriedade e indagou:

Este lugar é riquíssimo... Chego a pensar que ele é magico... Muito próspero e farto. Penso em ir buscar minha mãe e viver aqui com ela e minha irmã. Para isto eu teria que... Sabem o que eu teria que fazer...

O labrador branco se aproximou e lambeu os pés descalços de João... Os outros vieram em seqüência e fizeram o mesmo, concordando com qualquer decisões que ele tomasse.

Os dias largos terminaram e a primavera deu o ar da graça. O grande forno já havia sido construído e a velha amolava um grosso facão, sorrindo ao seu amado. João acendeu o grande forno... A lenha virou brasas vibrantes. Ela se aproximou do garoto e o ouviu perguntar:

Acha que a temperatura esta boa? Acha que teremos um bom assado?

A mulher lhe beijou os lábios, passou a língua limbosa por seus dentes e balbuciou:

Mais tarde quero lambe-los e sentir o gosto de sua irmã...

João sorriu, ela se aproximou da grande fornalha:

Esta meu querido... Esta em ótima temperatura... Vou já cuidar do prato principal.

Antes que ela tirasse a cabeça lá de dentro, João segurou em suas pernas e a atirou de vez dentro da grande fornalha. Efênia em desespero tentou fugir... João trancou o forno e a viu inutilmente se esquivar do carvão em brasa:

Maldita seja sua linhagem seu moleque infeliz!

Os gritos da velha ecoavam por toda a floresta... Maria correu em desespero... Os cães de orelha em pé olhavam sua antiga dona agonizar em meio as chamas curtas...

A mulher velha tardava a morrer... João aflito assistia a toda aquela agonia, já arrependido de ter feito o que fez. Maria assustada, pegou a lança de João e cutucava com ela a mulher que ainda gritava, com o corpo todo queimado. A lança entrava em sua carne e trazia com ela um pedaço... Maria ria e atirava os pedaços aos cães, que comiam, esperando por mais. João olhava a tudo aquilo indignado... Ora ou outra ela se deliciava com o macabro assado e o ofertava ao irmão, que indignado, vomitava em desespero.

Era tarde da noite quando a mulher se entregou a morte. Os restos dela queimavam no forno novo, enquanto João contava seu plano a Maria:

Iremos buscar a mamãe. Traremos ela para viver aqui com a gente, começaremos então nova vida.

A jornada é longa, irmão. Não agüento passar por tudo aquilo de novo. Proponho que você vá e me deixe a sua espera.

João olhou para o cranio seco em chamas e bradou:

Você ira comigo. Talvez eu precise de você. Levarei também seis cães e muita comida. Deixarei os outros seis tomando conta da propriedade.

Maria não mais ousou questiona-lo. João armou todas as coisas, pôs um fardo der comida nas costas de cada um dos seis cães escolhidos e se preparou para a jornada do dia seguinte.


Os cães soltos na propriedade receberam a ordem de devorar qualquer invasor. João destruiu o grande forno, a ultima lembrança da antiga proprietária do belo lugar. Deixou que os animais se alimentassem de qual cria quisessem e partiu, com a irmã e sua pequena matilha.

Caminhou pela floresta com sua irmã, brincando com ela e os seis cães... Quando chegou na estrada que separava as duas florestas, parou... Um batalhão de soldados ensangüentados passavam por ela, levando com eles cabeças de ateus, esticadas em pontas de bambus, mostradas como troféus... Esperaram a longa tropa passar e depois entraram na floresta gelada.

João avistou ao longe o grande lobo cinzento. Este veio mais próximo a ele. De longe mostrava sinal de felicidade, mas não se aproximou. Se mantinha longe como sempre fazia.

Os meses fartos se acabaram e a jornada ainda era longa. A comida agora era escassa, pois Maria tinha uma fome totalmente fora de controle. João então se arrependeu de te-lá trazido, deveria ter ignorado seu orgulho e a escutado, quando a mesma lhe propôs que ficasse na propriedade cuidando das coisas. Mas estava ele tão acostumado com sua presença, que não conseguiu mudar de idéia.

Maria reclamava de fome. Os cães famintos seguiam seu mestre.

Os dias correram e estavam eles todos fracos... O lobo cinzento pouco conseguia oferecer a João e sua tropa... E em meio a total escassez, João o ouviu sugerir:

Temos boa historia juntos, não garoto?

Sim – Concordou João – Temos...

Lembro-me como ontem... Ataquei a estocagem de sua família, ao lado de meu velho pai e minha irmã. Meu pai foi alvejado, e mais tarde em nosso novo encontro você executou minha irmã. Não te culpei, pois apreciei seu instinto, já que somos iguais. Mas o fato é que você carrega consigo novos amigos, podem lhes ser muito uteis... É triste vê-los tombar pela fome.

João raivoso encarou o lobo magro e perguntou:

Diga logo, cinzento desgraçado! O que sugere?

O lobo cauteloso, medindo o que ia dizer olhou para a gorda Maria:

Veja sua irmã, um fardo inútil que não precisa carregar. Ela deve ter boa carne, seria muito útil em nossa sobrevivência. Falamos abertamente, João: Da ultima vez minha irmã foi favorável a nossa ultima jornada... Nada mais justo que devorarmos a sua, ou então morreremos... A casa de sua mãe ainda esta a dias daqui... E você já parece perdido.

Não farei! – Respondeu João rangendo os dentes, enquanto seus cães aguardavam ansiosos sua decisão – A ultima pessoa que sugeriu que eu matasse minha irmã teve a carne queimada e serviu de alimento a minha corja.

O lobo olhou ao horizonte congelado e tentou a ultima vez:

Sinto ser persuasivo, rapaz... Mas apenas eu conheço o caminho que leva a casa de sua mãe... Não se esqueça que eu roí todos aqueles ossos que usou para marcar o caminho... Os ossos velhos de seu pai. Diante da fome faço uma ultima proposta: Permita que eu e seus cães deem fim ao sofrimento de Maria. Nos apreciamos de sua carne, você se satisfaz com a gente e seguimos a jornada no caminho certo...

João olhou para a irmã. Maria roía os próprios dedos... Os dedos gordinhos pingavam sangue e ela o chupava, ignorando a dor:

Vamos lá, João – Disse o lobo sarcástico – Antes que ela não deixe nada pra gente!

João abaixou a cabeça. Os cães se levantaram famintos e entenderam o recado. O lobo rápido e rasteiro pulou na jugular de Maria, enquanto os cães mordiam suas pernas e braços... João olhou horrorizado a toda aquela insanidade... Mas seu instinto aguçado fez com que ele fizesse parte do banquete, e junto com o lobo e os cães, devorou insano a gorda irmã.


Dois dias se passaram, João e os cães bem dispostos caminhavam juntos, rumo ao caminho guiado pelo lobo. Os cães então pararam... Ouviram barulhos de armas engatilhando... João olhou para o lobo e com ira indagou:

Você nos traiu!

O lobo cinzento olhou rosnento para João e respondeu voraz:

Como ousa dizer isto? Não seja tolo! Os soldados estão em toda a parte, recrutando novas pessoas para a guerra que estão montando!

João totalmente cercado, levantou as mãos e lamentou a sorte, sendo cercado por inúmeros homens armados até os dentes.


Sons de tiros ecoavam na cidade arrasada... A guerra agora não era contra os ateus, e sim contra os escoceses... João munido com sua arma disparava voraz contra os inimigos, conquistando novo território e cumprindo com seu dever... O tanque sujo de guerra encostou no monumento central, João em posse da bandeira do pais que o adotou, subiu no monumento, arrancou a velha bandeira e colocou a sua... Lá embaixo os soldados vibravam de intensa alegria, saudando o forte guerreiro... A guerra enfim terminou

João com a farda chegou em seu barracão... Os cães e o lobo lhe balançaram o rabo e o ouviram dizer:

Hoje fazem seis anos...

Um jovem soldado adentrou no barracão e anunciou:

Senhor! Recebemos denuncias de um informante que um desertor de anos atrás se esconde em meio a floresta gelada!

João sorriu, soltou os cães e ordenou:

Reúna os homens. Vamos busca-lo!

O lobo refazia o atalho com seu faro seguro... João com os cães e dezenas de soldados seguiam em jipes. O lobo parou diante um grande quintal, a velha casa de João... O rapaz desceu, olhou roupas velhas no varal... Os soldados e os cães rodearam a casa... João gritou:

Sei que esta ai, desertor! Saia para que possa ser julgado!

Minutos depois a grande porta se abriu. João olhou para a mãe, sem os braços e sem uma das pernas, com um pedaço de madeira amarrado no toco da coxa. Concluiu que o padrasto se alimentava dela, durante o grande inverno:

Deixe-nos em paz – Gritou ela – A guerra acabou!

João sorriu, se aproximou da mãe e constatou que seus dois olhos haviam sido arrancados. Acenou a cabeça para o lobo e os cães, que mais que depressa correu em direção a velha e a dilacerou com seus dentes afiados:

Saia daí, seu covarde – Gritou ao padrasto – Se esconde atrás da esposa que devora!

O homem saiu acabado. Na hora reconheceu João, do alto de sua glória. João empunhou a arma... Colocou em sua testa e disse:

Estava certo. Eu precisava mesmo me tornar um homem de verdade.

João – Sorriu o homem – Sabia que aquela carne não era a sua... Estava tão dura para ser carne de crianças...

João jogou a arma no chão e o esmurrava sem piedade, enquanto dizia:

Antônio Tenório, por assassinar três soldados e fujir em sua ultima batalha na condição de comandante contra o rei George, facilitando sua vitória, eu o condeno...

O homem ensangüentado pela surra o olhou sorrindo João sorriu também, pegou a arma do chão e disse antes de descarregar derrotado:

A morte!

Os soldados vibraram... João abraçou seus cães e ateou fogo na velha casa, queimando suas lembranças de menino.

Naquele mesmo dia seguiu na companhia de seus animais até a propriedade que era da velha senhora Efênia.... Deixou o jipe no acostamento da estrada que dividia as duas florestas e seguiu na com a matilha.

Quando chegou no grande quintal, foi surpreendido pelos outros cães raivosos, que confrontaram em latidos os seus. De dentro da velha casa, saiu Efênia, sorrindo, com apenas algumas queimaduras pelo rosto enrugado:

Ora, ora... Se não é o menino João... Agora um homem feito!

João espantado perguntou como aquilo tudo estava acontecendo. A velha devorava uma maçã, enquanto lhe contava:

O fogo não pode destruir a tudo, menino... Ele pode consumir sua lembranças de infância e os cadáveres de sua linhagem indecente... Mas não consomem a mim. Acho justo que viva seus dias de gloria, muito me forneceu de bom antes de me escarrar a morte. Vá em paz, suma desta floresta e viva sua vida. Leve com sigo seu lobo e deixe meus cães.

João olhou para os 12 cães juntos. Olhou para a velha e sorriu. Pôs a mochila nas costas e chamou pelo lobo, que o seguiu por todos os novos caminhos que ousou trilhar.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

A Casa dos Medos


Eram tantas da noite. Carla alisava seu escapulário e bebia despojada em uma casa noturna qualquer, se lamentando da decadência de seu ser, da falta de criatividade e da demissão tão certa... Era jornalista do “Diário Popular”, jornal local onde seu finado pai havia se destacado como grande mestre:

Sou um fracasso – Se disse em um gole de marguerita – E pior que isto, sou um fracasso mal compreendido!

Arrancou um cigarro da bolsa e riscou o esqueiro. Não pegou. Diante daquilo, ela respirou fundo e completou:

Fudeu... Nem acender a porra do cigarro eu consigo!

Felipe se sentiu confiante. Atravessou a multidão, girando um palito de fosforo nos dedos rápidos. Nunca fora tão fácil seduzir uma moça, e ele estava seguro de si. Se aproximou glorioso, riscou o fósforo e acendeu o cigarro:

Obrigada – Agradeceu Carla.

Antes que ele a paquerasse, Rosane adentrou esplendorosa na espelunca. Ganhou a atenção de Felipe, que distraído, queimou os dedos no palito ainda aceso. O DJ da casa quando á viu, tratou de colocar a musica que ela gostava, Jailbreak do AC/DC.

Rosane sorriu para ele a galera se agitou. Felipedeixou Carla e foi em direção a nova presa, mesmo sabendo que precisaria mais que um palito de fósforo para fisgar aquela. Carla, a fracassada, apagou o cigarro na marguerita e a bebeu:

Fodida fodida, fodida e meia fica!

Ele se aproximou cauteloso, confiante em seu ousado penteado:

Meu nome é Felipe. E o seu?

Rosane nada disse. Embalada na musica que curtia, o agarrou como a uma selvagem e o beijou, engolindo sua língua e mordendo seus lábios. Quando o soltou, deixou o cara maluco:

Me chama de Rosane, meu querido... Ou do que você quiser.

Ódio. Era o que Carla sentia dela. Rosane não passava de uma popular repórter policial, que cobria homicídios brutais e toda a má sorte. Na maior parte do tempo, ficava na delegacia, esperando a policia ser chamada e ia junto, de encontro a noticia fresca... era mesmo uma carniceira... Mesmo assim era uma profissional ousada, considerada pela maioria dos colegas como brilhante, e Carla tinha inveja da moça bem sucedida e muito bem lida, pois atrai inúmeros compradores de jornais, gente com o espirito pobre que gosta de saber das tragédias alheias. Rosane sorria desajeitada, beijando o gato que era para ser de Carla, que finalmente encontrou as cinzas de seu cigarro no ultimo gole de marguerita.

César se aproximou do balcão onde ela estava. Bebia uma cerveja long neck, quando perguntou:

Noite ruim?

Carla sorriu:

Mais uma entre todas os outras que já tive.

Ele sorriu, bebeu da cerveja e perguntou:

Você é a Carla Cioffi, não? Filha de Jorge Cioffi, o grande mito jornalistico do “Diário Popular”. Certo??

Sim – Respondeu ela, mais uma vez chateada por ser lembrada graças ao profissionalismo do finado pai – Essa sou eu.

César sorriu:

Eu sabia! Você escreve?

Sim. Estou escrevendo no “Diário Popular”. Você lê ele ainda?

Só as tirinhas e a programação de cinema – Respondeu o rapaz sincero – Desculpe, mas depois que seu pai fechou os olhos, aquele jornal voltou a ser um jornaleco, cheio de porcarias. Olha lá ela – Disse apontando os olhos para Rosane, que dançava aos beijos libidinosos com Felipe – Se não fosse aquela vadia ali, que atrai leitores urubus, o jornal já tinha falido faz tempo...

Carla sorriu, por compartilhar da mesma opinião que ele:

Mas ai – Continuou o agora bom rapaz – Vou prestar mais atenção no jornal, pra ler alguma coisa sua. Eu conhecia seu pai pessoalmente. Sabia que ele tinha você como filha, pois os via na coluna social. Mas não sabia que você escrevia.

Filha de peixe, morre afogada. Não escrevo como ele. Não chego nem aos pés do cara. Ele era muito foda, muito talentoso... Pra chegar ao nível do meu pai eu teria que passar tudo que ele passou, e sinceramente, para isto eu precisaria mais que uma vida. E uma vida bem mais interessante que esta.

César sorriu:

Só precisa fazer as matérias certas, furos de reportagens como ele.

O telefone de Rosane tocou. Ela largou dos lábios de Felipe e atendeu. Era Francisco, o repórter de plantão na delegacia de policia:

Rosane! Corre para antiga casa dos Pedrosos! Novos homicídios lá, o cara ficou louco e matou toda a família! Corre pra lá que é um furo de reportagem do caralho!

Rosane desligou o celular desajeitada. Discou para seu fotografo. O aparelho estava desligado. Ela se desesperou. Carla de longe percebeu sua afobação. Se aproximou dela com César e perguntou:

O que houve, Rosane.

Ela sorriu, como se recebesse boa noticia:

Novo homicidio na casa dos Pedrosos! A nova família que se mudou pra lá a uma semana foi morta pelo pai! Tenho que ir pra lá urgente, mas não consigo contactar o puto do fotografo!

César ainda tímido se pronunciou:

Bem... Eu fotografo. Se eu puder ajudar...

Você tem uma câmera ai?

Sim – Respondeu ele – No carro. Eu sempre carrego meu equipamento. Fotografo e filmo casamentos, formaturas e outros eventos.

Excelente. Vamos comigo!

Felipe desesperado perguntou:

Calma ai, gata! E nosso lance?

Rosane sorriu profissional, sem responder. César a seguiu e Carla chocada por perder mais um pra moça, olhou para Felipe arrancar a caixa de fosforo do bolso e descaradamente perguntar:

E ai, anda vai querer fumar aquele cigarro?

De repente César voltou no salão, a segurou pelos braços e falou:

A Rosane disse que você pode vir com a gente! Isso vai virar um caso alem das paginas sangrentas que ela escreve, é sua grande chance de escrever uma grande matéria!

Carla que não sabia cavar oportunidades como o pai, sorriu com a ajuda do novo amigo. Felipe foi atrás deles para ver de camarote a grande tragédia.


Chegaram na casa as pressas, no carro de Rosane. Os quatro desceram e estranharam... Não tinha nenhum carro policial estacionado na frente da casa. Rosane viu pela janela o homem conversando normalmente com a esposa na sala, e depois ir a cozinha. Do lado de fora disse preocupada:

Que merda é essa? Esta tudo normal! O Francisco se enganou?

Discou para o repórter policial e perguntou estressada:

Puta merda, Francisco! Você recebeu informação errada! Não tem homicidio algum na velha casa dos Pedrosos!

O homem assustado perguntou:

Do que diabos esta falando, Rosane?

Não seja imbecil! Você me ligou dizendo que o novo morador ficou louco e assassinou toda a família!

Francisco sorriu:

Você deve estar louca... Hoje estou de folga. Estou é em casa, tentando fazer sexo com minha senhora, e você esta atrapalhando tudo! Você é broxante, sabia?

Rosane desligou. Olhou para os três sem nada entender e disse constrangida:

Acho que me equivoquei. Eu devo estar ficando louca... Foi alarme falso, gente, desculpa.

Os quatro estavam na calçada. Felipe olhou pela janela da cozinha e viu que o homem segurava uma grande faca. Sorriu atento, e viu o homem caminhar e surgir já na grande janela da sala, próximo a esposa que lia uma revista, sentada no sofá. O viu empunhar a faca raivoso e indagou:

Meu Deus! Olhem aquilo!

Os três olharam. O homem voraz, de trás do sofá esfaqueou a esposa, que segurava seus braços enquanto recebia inúmeros golpes, até amolecer... César impressionado olhou para Carla:

Precisamos avisar a policia!

Rosane com o aparelho na mão discou.... Carla olhou o homem subir as escadas e disse preocupada:

Não vai dar tempo da policia chegar! Pode ter mais alguem lá em cima... Talvez até crianças!

Precisamos fazer alguma coisa – Bradou Felipe preocupado – Vamos impedir!

Os três abriram o grande portão e entraram. Rosane em estado de choque tentava discar para a policia, mas o celular só chiava...

Preciso de outro aparelho!

Entrou atrás dos amigos, para pegar outro celular emprestado. Quando entrou o grande portão se fechou... Ela assustada se voltou as grades. Não conseguiu abrir e apavorada, correu em direção aos outros.

César e Felipe arrombaram com dificuldades a grande porta... Entraram na sala e viram a mulher ainda se estrebuchar na sala, golfando sangue:

Meus filhos... Os salvem – Disse ela em desespero, com a barriga com inúmeros buracos.

A mulher fechou os olhos e se entregou a morte. Eles não entenderam como ela ainda conseguiu falar. César bateu uma foto. Carla o olhou e admirou seu profissionalismo diante de tudo aquilo. De repente, ouviu um grito de menino vindo lá de cima:

Meu Deus! – Se desesperou Carla.

Subiram as escadas as pressas... A porta de um dos quartos estava arrombada... O pai estava na cama de um dos filhos pequenos, o esfaqueando descompassado, enquanto o outro chorava em um canto, pronto a ser o próximo. César segurou um quadro posto no corredor e atingiu a cabeça do homem, que raivoso largou o cadáver do menino e se voltou a ele, munido com a faca. Rosane arrancou a gaveta da comoda e bateu na cabeça do homem... Carla e Felipe tentavam segurá-lo, mas ele estava totalmente fora de si, disposto a estraçalhar o que visse a frente. César recebeu uma facada no braço. Gritou de dor, enquanto Felipe desferiu um forte soco na cabeça do homem bigodudo. Este mal sentiu o golpe, se voltou a Felipe com sede de sangue, até um pedaço de ripa afiado invadir seu cranio e sair em seu olho esquerdo. A ponta da ripa com o olho espetado ficou a milímetros da face desesperada de Felipe... O homem se virou cambaleando... Se aproximou da janela e caiu lá de cima...

Os quatro olharam para baixo e o virão, empalado em cima do cercado da horta, feito de outras ripas pontiagudas. Carla que desferiu o golpe fulminante, abraçou César chorosa, lamentando ter que fazer oque fez:

Está tudo acabado, Carla... Você fez o que tinha que fazer... O desgraçado estava descontrolado, você nos salvou do pior!.

Rosane abraçada com o menino de seis anos disse:

Não consegui ligar para a policia. Vim buscar o celular de vocês.

César com o braço sangrando discou para a policia. O celular de Felipe tocou, numero desconhecido. Ele atendeu e era César:

Porque discou pra mim? De onde conseguiu meu numero?

César o olhou assustado:

Não tenho seu numero! Disquei para a policia e caiu em você...

Todas as vezes que discavam para a policia, caia no numero de um deles. Se olharam indignados.

Rosane foi cobrir o menino morto na cama. Reparou que era gêmeo do outro pequeno. Olhou para o irmãozinho e disse chorosa:

Sinto muito... Eu te prometo que tudo ficará bem.

César amarrou um pano velho no braço cortado. Se aproximou do garoto e perguntou:

Alem de seus pais, tem mais alguém na casa?

Sim – Respondeu o menino com o rosto em lagrimas – Minha irmã, Talita. Ela está no quarto ao lado.

Carla se aproximou do quarto, abriu a porta e deu de frente com uma moça... Foi até ela, estava com os pés e as mãos amarrada na cama. Uma grande câmera de vídeo posta em um suporte se direcionava a ela. O olho estava roxo e a coitada estava sem as peças intimas. Tinha uma grande quantidade de fitas cassetes no quarto. César entrou curioso pegou uma, todas estavam com datas. A colocou no aparelho velho e viram imagens do pai violentando a filha:

Deus meu – Disse Felipe indignado – O sujeito era um monstro!

César passou a mão na cabeça e disse preocupado:

Temos que sair daqui e avisar a policia!

A menina acordou... Olhou para os lados e sorriu. Diante dela, Carla impressionada alarmou:

Como ele pode fazer tudo que fez?

Desamarraram a menina. Carla a cobriu com o lençol, a coitada estava fora de si, parecia que havia sido drogada pelo pai... César abriu as gavetas e constatou inúmeras seringas e comprimidos:

Que insano... Ele a dopava para ela não oferecer resistência...

A deixaram no quarto. Correram em direção ao grande portão. Tentando inutilmente abri-lo. A chuva começou a cair desgraçadamente:

Estamos presos aqui – Disse Felipe – Temos que pular o portão... Ao menos um de nós precisa fazer!

Carla olhou para o cadáver do homem sujo espetado na cerca de balaustra. Se voltou aos amigos e os lembrou:

É muito alto.

Acho que consigo – Disse Felipe, pronto para subir.

Todos concordaram. Rosane olhou para o alto, viu três linhas de fios correrem pelo muro e contou:

A cerca é elétrica. Esta chovendo... É muito perigoso.

Tenho que tentar. Torçam para estar desligada.

Quando Felipe se aproximou da grade seu coração disparou. Estava totalmente molhado... Segurou a respiração e tocou nela... Um grande corrente elétrica percorreu seu corpo... Permaneceu colado na armação, se estrebuchando em meio ao chão molhado:

Não toquem nele – Disse César – Se tocarem ficaram coladas e tomaram o choque também!

Pegou um grande galho seco e golpeou fortemente a barriga de Felipe, que caiu para trás babando...

Temos que levá-lo pra dentro!

O arrastou para longe dali com a ajuda de Rosane. Carla olhou para a cerca de balaustra e se impressionou:

O desgraçado não esta mais lá!

Os dois olharam e lamentaram. Rosane respirou fundo e respondeu:

Ficaremos seguros lá dentro... Até resolvermos o que fazer. Vamos entrar.


Carla cobriu o cadáver da mulher no sofá. Rosane forrou um edredom no chão da sala e cuidava de Felipe ainda desmaiado, o menino sentado em outro sofá brincava com seu boneco, parecia que nada estava acontecendo. César olhou as escadas e decidiu olhar a menina no quarto... Felipe respirava aos poucos, recobrando a consciência, mas ainda tinha partes do corpo com graves queimaduras.

César abriu a porta devagar e a viu deitada na cama... Seus olhos medrosos a flagrou se masturbando e gemendo... Diante daquilo ele se impressionou, ela sentiu sua presença e o convidou a entrar... Com medo, César trancou a porta e caminhou até o outro quarto com o menino morto.

Um monte de insetos o devoravam, enquanto o pano que o cobria estava no chão. César olhou para o chão frio e flagrou insetos caminhando em direção a ele. Fechou rapidamente a porta... Sem querer pisou em cima da correição de formigas que levavam minúsculos pedaços da carne do garoto:

Essa casa... Essa casa esta amaldiçoada!

Olhou novamente pelo buraco da fechadura do quarto da menina, e deu de frente com seus olhos grandes e azuis... Se afastou com o coração disparado... Correu em direção aos amigos. Felipe já conversava normalmente, mas ainda estava deitado no edredom.

Rosane olhou lá fora, acompanhou um vulto passar pela janela. Viu a porta da sala arrombada por eles e correu até ela. A trancou, colocando contra a maçaneta uma grande e velha mesa. Olhou para os três e disse:

Talvez estejamos seguros aqui dentro. Mas só talvez. Temos que ficar juntos até o dia amanhecer...

Carla olhou para o relógio que acusava onze e meia. Se voltou a Rosane e disse desanimada:

Acho que esta noite vai ser bem longa.


A porta da cozinha bateu. César correu em direção a ela e viu pelo vidro o homem com a ripa atravessada no olho esquerdo tentando entrar. Se desesperou e empurrou o fogão contra a porta... O homem era forte e a forçava... César pediu ajuda, Felipe mal conseguia se mexer, as meninas foram a seu socorro, juntos arrastaram a geladeira pesada para proteger a porta.

Lá na sala, Felipe deitado, olhou para o menino brincando com o boneco. O menino se aproximou dele. Sorriu. Foi até o ferro de passar roupa, arrancou a tomada e emendou cada ponta em um pedaço de ferro, retirados da mesa que escorava a porta da sala. Se levantou... Felipe o olhou assustado... O pirralho arrancou o pipi pra fora e mijou na cabeça dele... Felipe estava com os nervos atrofiados devido ao choque... Mal conseguia falar... De olhos arregalados tentava entender a intenção do garoto... Balbuciava, implorando para que ele parasse com aquilo... Este lhe sorriu novamente, com a tomada na mão... Os três estavam ocupados segurando a porta... O garoto riu e ligou a tomada...

Felipe recebia a nova descarga elétrica e tremia no chão molhado pela urina. O garoto se voltou a seu boneco e continuou a brincar...

Uma fumaça saia do corpo de Felipe, enquanto ele batia os dentes e se entregava ao eletrocutamento...


Carla sentiu o cheiro de queimado vindo da sala... Deixou César e Rosane segurando a porta e correu em direção a Felipe... Encontrou seu cadáver em chamas, enquanto o menino brincava, como se nada tivesse acontecido... César em desespero sentia o defunto esmurrar a porta protegida por ele e por Rosane, prestes a arrombá-la... Olhou para as cadeiras de ferro e enfim sugeriu:

Não aguentaremos a porta por muito tempo... O desgraçado tem uma força incomum! Vou soltar, pegar uma cadeira daquelas e quando ele avançar, eu o golpeio... Depois que ele entrar vá até a sala e veja se a mulher também esta viva e a destrua! Carla esta lá e pode ser atacada.

Rosane tremeu, consentiu, sabendo não ter outra saída. César soltou a porta, abraçou a cadeira de ferro... Rosane correu na gaveta e pegou um facão de cortar carne, o guardou na cintura... O morto ganhou mais apoio e empurrou desesperado a porta... A geladeira que a protegia tombou, Rosane correu até a sala, se aproximou do sofá e descobriu o cadáver. Carla olhava perplexa Felipe queimar:

Carla – Disse Rosane em desespero, enquanto constatava se a mulher estava viva – Precisamos de você! Ele já está morto, deixe-o e nos ajude...

De repente o cadáver da mulher morta segurou Rosane pelo punho. Rosane congelou de medo. O menino olhou curioso e sorriu, vendo a mãe morta-viva. Carla segurou no pescoço do mulher morta, tentando esganá-la para soltar a amiga... Rosane alcançou a faca na cintura com a outra mão e com um único golpe, decepou o pulso do cadáver, o decepando e se vendo enfim livre. Carla tomou a faca da mão da amiga e a cravou na testa da mulher, que de olhos arregalados, parou de se mexer...


Enquanto na cozinha o defunto avançou voraz em direção a César, que segurava a cadeira de ferro, quando o desgraçado se aproximou, recebeu um golpe triunfante. César com estilo o golpeou outras vezes, firme em destruir aquele ser abominável...

O sangue sujo do morto espirrava por toda a cozinha... César em ira eterna o esmagava feroz... Sentia seus ossos se quebrando e sua carne se soltar, espancou com firmeza para o infeliz nunca mais caminhar entre os vivos... Largou a cadeira depois que o defunto virou carne moída. Sorriu satisfeito e vitorioso.

Carla pegou o lençol que cobria a mulher. O menino apenas as olhava, tentando descobrir o que fariam com a mãe:

Melhor acabarmos logo com isto... Vamos destruir ela... Eles estão todos amaldiçoados!

César entrou na sala, segurando a cadeira pesada e ensanguentada:

Rosane tem razão... Vamos trancar o menino e atear fogo no casal e na outra criança morta... Tudo isto aqui esta alem de nossa compreensão... Ou nos livramos dos corpos ou corremos o risco de ser brutalmente massacrados por eles, tal qual o Felipe!

Sim – Respondeu Carla – Mas e quando tudo isto acabar pela manhã? Como explicaremos as autoridades que colocamos fogo nos cadáveres? Vamos dizer que antes disto eles ressuscitaram e nos atacaram? Não vão acreditar! Vamos deixá-la trancada na dispensa, vamos até o quarto onde esta o menino morto e trancá-lo. Temos que nos precaver... Felipe já esta morto, já perdemos muito nos envolvendo em tudo isto...

Rosane se aproximou do garoto. Se abaixou diante dele, colocou o dedo em seu queixo e fez com que olha-se pra ela:

Ei menino... Conta pra mim... Quem fez isto com o Felipe? Foi você?

O menino com cara chorosa apontou o dedinho para a mãe:

Ela mandou eu fazer!

Rosane se levantou. Olhou para Carla e disse atrevida:

Que se foda!

O que? – Perguntou Carla não entendendo.

Eu disse que se foda! Eu curtia aquele cara que agora tá torrado ali! Se quer saber eu tava caindo na lábia dele e se não estivéssemos aqui, ia rolar muita sacanagem no meu apartamento! Não gosto que toquem no que é meu! Que se foda as explicações de amanhã! César esta certo, temos que queimá-los, como insetos que são!

Caminhou até a sala, em um balcão cheio de copos. O abriu e viu bebidas. Pegou um litro de Control e voltou em direção a mulher. Jogava a bebida por cima dela. Esta, com a faca cravada na testa e sem o punho dizia chorosa:

Por favor... Eu estou viva!

Rosane sorriu, olhou para o cadáver queimado de Felipe e disse:

É, mas ele não!

César e Carla não ousaram discordar. Subiram até os quartos onde o menino morto e a menina nua estavam.

Tem insetos... Formigas e insetos devorando o cadáver do garoto... Temos que tomar cuidado. Acho que o melhor a fazer é isto mesmo... Precisamos queimá-los. Temos que sobreviver a isto, não podemos facilitar.

Rosane riscou o fósforo. O menino largou o boneco, se levantou e indagou feroz:

Não faça isto com ela sua vagabunda!

Rosane o olhou curiosa. Ignorou o pedido e jogou o fosforo no corpo da mulher....

As chamas a cobriam e ela gritava agonizante, dizendo estar viva. O menino pegou um dos pés da cadeira e bradou:

Eu disse pra você não fazer!

Rosane se afastou do garoto de apenas seis anos... Sorriu ainda curiosa com o que aquela criaturinha mirrada poderia lhe fazer:

Você tá merecendo umas chineladas, pivetinho!

O menino irritado foi com tudo em direção a ela. Rosane segurou na barra de ferro e a tomou dele:

Que coisa feia! Vai ser um monstrinho igual seu pai?

O dominou pelo braço e o segurou pelo pescoço:

Eu vou destrinchar você sua vagabunda... Você não devia ter se metido em tudo isto!

Rosane se arrepiou, jogou o menino no chão e percebeu que não era mais ele:

Não tenho medo de nada – Disse ela o encarando – Já passei pelo pior na vida!


Com cautela César abriu a porta do quarto escuro do garoto. Acendeu a luz fraca e o viu, sentado na cama, comendo os insetos que retirava do próprio corpo. Carla se arrepiou, o menino gêmeo do outro que estava com Rosane, os olhou. Os olhos brilhavam avivados, e ele sem deixar de comer os insetos, disse aos invasores:

Vocês estão condenados...Foram arrastados pra cá e agora faram parte da maldição deste lugar...

Carla se aproximou. Ele parou de devorar os insetos e lhe disse:

Seu pai era um homem notável, Carla...

Como sabe de meu pai?

O garoto colocou o dedo na correição de formigas, dezenas delas subiram em seu dedo miúdo. Ele pôs o que pode na boca e contou:

Sei muito mais dele que você... Ele cobriu o massacre dos Pedrosos... Este lugar tem historia, historia esta que ele contou no maldito jornal. Mas ele não contou tudo. Contou apenas aquilo que as pessoas conseguiam entender. E fez muito bem... Mas e você, Carla Cioffi? O que contara amanhã no jornaleco falido?

Carla se assustou olhou para o menino sem nada entender. César a segurou pela mão e sugeriu:

Melhor sairmos daqui!

A porta então se fechou, os trancando lá dentro. O menino os olhou e perguntou:

Vivos?


Rosane estava com o menino totalmente dominado, amarrado no chão, olhando a própria mãe queimar e pedir ajuda. A moça sorriu pelo feito, se voltou ao armário e encheu um copo com wyskey. Bebeu um gole olhou para a porta e o viu, esplendoroso de terno e gravata, a olhando aos risos:

Roxane – Indagou ele admirado.

Ela sorriu. Bebeu mais um gole e o corrigiu:

Não é Roxane, já falei... É Rosane, Jorge Cioffi...

Era o pai morto de Carla. Rosane se aproximou do homem morto, de pé diante dela. Ele pediu que ela parasse, limitando seu espaço entre os vivos:

Roxane... Roxane do “The Police”. Era bem assim que eu gostava de te chamar, você se lembra?

Rosane chorou saudosa:

Sim, amor... Eu me lembro... Eu sento sua falta...

Ele a olhou serio:

Rosane, vocês precisam ficar juntos... Precisam sobreviver a tudo isto. Esta casa esta amaldiçoada, condenada ao caos... Eles querem destruir vocês, querem ser lembrados as custas da violência e do ódio. Por favor, Rosane... Fiquem juntos e atentos, não os deixem vencer, não se deixem levar pelo ódio. Se controle, mulher! Se controle e se mantenham firmes até o amanhecer!

Rosane sorriu. O fogo cobriu Cioffi e o inferno lhe arrastou de volta, depois que ele terminou de lhe dizer:

Eu só vim te avisar, Roxane... Cuidem-se...

Rosane abandonou o copo. Olhou para o menino e perguntou:

Você viu isto também, pirralho?

O garoto cuspiu raivoso no chão:

É – Disse ela – Foi o que eu pensei!


César se aproximou da porta e tentou abri-la... Não conseguindo começou a chutar... O menino que devorava insetos sorria, Carla foi junto ao amigo e tentaram escapar dali. De repente, sentiu as formigas subirem em suas pernas. César também se sentiu infestado... Outros insetos esvoaçavam pelo quarto e posavam sobre eles... O menino sorriu ainda sentado, apreciando o ataque. César e Carla sentiram o corpo sendo dominado e ferroado por milhares e milhares deles, que chegavam aos montes pela janela aberta.

Rosane lá debaixo escutou os gritos e subiu as pressas pela escada... A porta do quarto da menina se abriu. Ela saiu nua lá de dentro e sorriu para Rosane:

Merda – Indagou Rosane, lamentando a sorte.

A moça a sua frente sorria abrindo as mãos... Mostrava suas unhas cumpridas e sujas. Rosane as olhou, enquanto escutava os gritos desesperados de César e Carla, dentro do quarto com o garoto:

Pensa em ajuda-los? – Perguntou a moça nua – Sabe que terá que passar por mim... Te digo que não será fácil!

César se debatia, arrancando os formigões e outros insetos que mordiam seu rosto já todo coberto... Carla gritava tentando abrir a porta e se batendo em desespero... Estavam condenados, enquanto o menino morto sorria, devorando outros insetos.

Rosane foi para cima da moça e logo tomou uma unhada no rosto branco. O sangue desceu nos três riscos da bochecha... A moça sorriu sádica. Rosane em ira a pegou pelos cabelos e a esmurrou no limite do ódio...

As duas se unhavam e puxavam os cabelos... Rosane estava desfavorecida, a moça parecia não sentir dor e ria da fraqueza da rival. Rosane no chão rolou com ela até os pés da escada, então teve a idéia... Deu uma joelhada no estomago da moça nua e a viu se levantar quase sem ar... Rapidamente foi até ela, se aproveitou de sua fraqueza empurrou escada abaixo...

A moça despencava com seu corpo pelado e moreno, tentando se segurar na parede com as unhas cumpridas... Acabou por chegar ao chão de cabeça, quebrando o pescoço... Lá de cima Rosane viu a poça de sangue se formar em volta da moça morta... Vitoriosa, correu até o quarto do garoto e abriu facilmente a porta.

César e Carla saíram lá de dentro em desespero.... Rosane tentava ajuda-los a remover os insetos, os tacando no chão e os esmagando com os pés... Quando conseguiu liberta-los, olhou o menino grunhir diante dela e pular a janela, escalando a parede até o telhado... Os três olharam para cima e o sentiram caminhar sobre a casa... As telhas trincavam e faziam um barulho estranho, enquanto ele continuava a grunhir como um inseto...

Rosane os olhou com o rosto dilacerado. César viu a porta do quarto da moça aberta e perguntou:

Onde ela esta?

Rosane apontou para a escadaria, lá abaixo a moça morta de cara no chão, com o pescoço quebrado e a poça de sangue em volta da cabeça:

Temos que queima-lá! – Indagou Carla – Ela é mais perigosa agora!

Rosane toda cortada caminhou pelo corredor dizendo:

Preciso ir até o banheiro limpar esses cortes...

Carla estranhou ela abrir uma porta segura que era o banheiro:

Como sabe que o banheiro fica ai?

Rosane sorriu. Olhou para trás e perguntou:

Quer mesmo saber, lindinha? Já estive aqui antes, ainda na época de seu pai.

Carla e César se aproximaram dela, Rosane despudorada contou:

Quando comecei minha carreira de jornalista, tive muito apoio de seu pai, Carla... E se quer saber, ele me ensinou tudo que eu sei. Quando o senhor Valério Pedroso ficou louco, estuprou e matou a filha e a esposa... Foi a maior tragédia desta cidade de merda! Na reconstituição do crime, o desgraçado conseguiu uma brecha e se suicidou aqui dentro, uma semana depois de tudo. Seu pai investigava o caso, na condição de repórter policial. Eu tinha apenas 17, e era leitora assídua do trabalho dele. Um dia ele me convidou para vir até aqui, sabe... Conhecer a cena do crime, ver como as coisas funcionam... Eu aceitei. E a partir dali começamos a ficar juntos... Ele tinha acesso a esta casa, era o trabalho dele saber tudo sobre os Pedrosos, e usávamos este lugar para ficarmos noites e noites juntos. Acho que fudemos por esta casa inteira... Seu pai me tornou tudo que eu sou... Eu o amava... O amava como profissional e como homem.

Carla ficou sem palavras diante a descoberta do caso do pai bem casado. Em um minuto pensou na mãe, nos irmãos, na família bem estruturada... Uma grande mentira! Rosane antes de fechar a porta do banheiro confessou:

Ele apareceu para mim hoje, na sala... Disse para nos cuidarmos e ficarmos juntos até tudo isto passar.

César interrompeu seus pensamentos a puxando pelo braço:

Ei, Carla! Temos que nos livrar do corpo da moça!

Os dois foram até os pés da escadaria, olharam para baixo e apenas encontraram a poça de sangue. Assustados, se olharam e desceram. Lá embaixo o menino ainda estava amarrado. Carla o olhou e sentiu pena. César passou as mãos na cabeça e condenou:

Estamos encrencados! Ela esta por aqui e vai nos atacar!

O menino estava normal, sem traços de possessão. Carla ousou desamarra-lo e o abraçou:

Tudo ficará bem, eu te prometo...

O menino em lagrimas se sentiu seguro.


Rosane no banheiro limpava os cortes da bochecha... Ligou a torneira da pia e enquanto se olhava no espelho, embebedava um pano com agua e passava no ferimento profundo. Tinha mais ferimentos por todo seu corpo, as longas unhas da moça dilaceraram até sua roupa de oxford para invadir sua carne. Arrancou todas as peças, nua, lamentando os cortes bizarros em seu corpo delineado. Escutou um barulho vindo do box. Se arrepiou quando alguma coisa pesada caiu do vitro pequeno, dentro da banheira! Abriu ousada a porta de correr e constatou com espanto: Era a moça morta.

De pescoço quebrado, deitada na banheira virou a cabeça e a encarou. Sorriu em desvantagem e colocou a própria cabeça no lugar:

Rosane... Ou Roxane, aos íntimos... Você pensou que seria tão fácil, não?

O coração fraco de Rosane disparou. Ela tentou inutilmente abrir a porta, a moça morta colocou os dedos nos lábios frios e contou:

Estamos tranqüilas aqui... Ninguém nos incomodará, minha querida...


Na sala, Carla olhou atenta para as brancas paredes que pipocavam... César se aproximou e a olhou com atenção:

Merda, Carla! Formigas! Formigas, besouros e até escorpiões! Precisamos dar um jeito de sairmos daqui!

Aos poucos chegavam mais insetos... O menino medroso e livre da possessão abraçou Carla, que o consolou dizendo que tudo acabaria bem.

César foi até ele e perguntou:

Tem alguma arma nesta casa, garoto?

O menino pensou por segundos e confessou:

Meu pai tem uma espingarda no quarto dele... Ele á esconde em cima do guarda roupa para não alcançarmos. No porão tem algumas coisas de caça, meu pai caçava sempre na primavera.

César perguntou aonde ficava o quarto dos casal, o menino apontou para frente e ele correu até lá. Carla olhou para a porta que dava ao porão, arrancou o escapulário do pescoço e pôs no menino:

Vou até o porão achar alguma coisa... Fique com este escapulário, ele te protegerá do mal. Prometo voltar rápido.

O menino com medo segurou com força o escapulário. Carla foi até a porta e a abriu, olhando fixamente toda aquela bagunça.


No banheiro, Rosane tremula enfrentava a irá da moça morta. Um frio arrasador entrou pelo vitro aberto e ela nua como sua algoz, sentiu um frio congelante lhe dominar. A moça se aproximou dela e a tocou nos ombros... O calor vindo de suas mãos parecia ser do inferno, mas a aquecia da turbulência do frio noturno. Rosane se sentiu protegida por segundos... A moça se aproximou de sua orelha gelada e com o quente halito balbuciou:

Ele te chamava de Roxane... Não?

Rosane não mais tremia de frio, tampouco de medo... Se lembrou de Jorge... A moça lambeu sua orelha e arrastou levemente a mão até seus seios médios... Rosane parecia hipnotizada... Se entregava sem pudor as caricias da morta.

Desceu com a língua até seu corpo dilacerado... Rodeou com a ponta o umbigo, com as mãos massageando seus quadris. Rosane ainda hipnotizada forçava a cabeça da moça morta até seu sexo...

A língua da morta se esticava até sua vagina, a invadindo mais e mais... Rosane em desejo extremo apertou a cabeça da morta e deixou o orgasmo lhe dominar... Quando terminou caiu em si, e sentiu a língua longa lhe adentrar já na carne viva...

A empurrou já acordada, a morta limpou a boca babada pelo sumo de seu sexo, sorriu e a condenou:

Espero que tenha se divertido... Você tem um gosto delicioso!

Rosane não encontrou armas para se defender, a moça morta lhe desferiu um novo corte com a unha, seguido de outros e outros... O sangue grosso e quente escorria de seu corpo... Rosane tentava forças para lutar, mas era dominada e ganhava novas dilacerações... Tombou impotente... Sua garganta também cortada impossibilitava um pedido de ajuda... A moça sentou sobre seu corpo deitado, lambeu as unhas com pedaços finos de sua carne e disse aos risos:

Realmente você é muito gostosa, Roxane...

A mão direita da moça entrou com tudo no estomago de Rosane. Arregalou os olhos e sentiu a mão vagar por dentro de seu corpo... O sangue sujo saia de sua boca em pedidos de ajuda... Sentiu a presença de Jorge Cioffi, que segurou no ombro da morta e implorou que ela parasse:

Chega... Por favor... Já esta feito... Deixe-a ir em paz.

A morta arrancou a mão ensangüentada de dentro de Rosane e sorriu leve, a abandonando agonizante. Saiu pelo mesmo vitro que entrou.

Jorge abraçou Rosane e disse calmo:

Esta tudo bem agora, Roxane... Esta tudo bem...

Rosane sentiu o abraço da morte e se entregou, no frio congelante das trevas.


O menino só na sala, sentiu a presença maligna lhe rodear. Fechou os olhos e apertou firme o escapulário... Os espíritos sombrios agonizaram e sumiram de perto dele.

No porão, Carla encontrou um arpão de cabo longo, se sentiu satisfeita e de lá saiu as pressas. César ainda não havia voltado.

No quarto do casal, César com a espingarda na mão, estava tão admirado que não viu a janela se abrir. Olhou para a cama e a viu, deitada ainda nua. Era a moça morta. Ele a encarou, mirando em sua cabeça... Ela sorriu e se masturbou em sua frente... César sentiu seu espirito se elevar... A arma caiu no chão e ele perdeu o controle e o rumo da situação... A moça morta sorriu, se aproximou dele e abriu suas calças:

Não tema, lindo... Eu só quero te fazer feliz


Carla viu uma quantidade maior de insetos nas paredes... A telha da casa se quebrava com mais violência. O susto a dominou e ela deu de frente com Rosane, morta e nua, com inúmeras dilacerações pelo corpo. A olhou perplexa, então diante dela surgiu seu pai:

Papai...

Ele limitou seu espaço, pedindo para a filha não se aproximar dos dois. Abraçou Rosane para aquece-lá e bradou:

Isto tem que acabar, amor – Olhou para cima, em direção ao barulho infernal e profetizou – O menino vai descer, se o fizer vocês não terão chance... Vocês precisam sair daqui, e a única forma daquele portão se abrir é o sacrifício...

Sacrifício?

O homem balançou a cabeça e olhou para o menino medroso.


No quarto, César fora de si, possuía despudoradamente a moça morta... Ela como uma selvagem dilacerava suas costas enquanto rebolava em seu sexo. César no limite do prazer se deitou na cama, totalmente entregue a morta que se remexia feito uma cobra sobre ele... Quando gozou satisfeito, caiu em si... Ela com as unhas em seu peito, sorriu majestosa, pronta para lhe matar.

As unhas finas e quebradiças cortaram sua carne e adentraram milimetro por milimetro...

De repente, a ponta do arpão entrou pela costas da moça nua... César com ela ainda sentada sobre ele, viu o meio de seu peito se abrir e seu sangue ainda quente cair sobre ele. A moça morta golfou mais sangue, o arpão foi e voltou em três novos golpes. Ela sentada sobre César, olhou para trás com o pescoço quebrado, então viu Carla com ira, segurando o arpão ensangüentado:

Vaca amaldiçoada de merda! – Praguejou a morta.

Carla sem pudor, a perfurou no pescoço, atravessando violentamente o arpão. E quando o puxou de volta, trouxe com ele sua cabeça. César empurrou o cadáver decapitado da moça, se limpou daquele banho de sangue e se vestiu... Abraçou Carla e disse com medo:

Temos que sumir daqui! A maldição é muito forte...

César pegou a espingarda e os dois foram até a sala... As paredes que eram brancas estavam cobertas por milhares e milhares de insetos. Carla munida com a faca, deixou uma lagrima escorrer de seus olhos... Se direcionou a César e confessou chorosa:

Só a um jeito de sairmos vivos de tudo isto...

Foi corajosa até o menino, o deitou no chão e disse sem parar de chorar:

Tudo ficará bem meu amor... Eu te prometo...

O menino de olhos fechados apertou firme o escapulário, Carla com toda a coragem do mundo aproximou a faca de seu pescoço... O garoto rezava para o escapulário livra-lo de tudo aquilo... O telhado roía mais violento e César, testemunhando o sacrifício, nada falou, pois queria sair logo daquele inferno.... Sentiu o forro roer... Se armou com a espingarda e bradou a Carla:

Faça logo, mulher!

Carla esperava coragem... O menino abriu os olhos, respirava fundo e a olhava apavorado:

Feche os olhos meu amor. – Pediu Carla tremendo.

Ele não fechou... A faca deslizou afiada em seu pescoço fino... O sangue escorria e ele tremia nas mãos da mulher...

Carla e César escutaram o portão se abrir depois do ultimo suspiro do menino... Olharam vitoriosos e se prepararam para sair, quando o forro rachou e o outro menino morto caiu violentamente lá de cima.

César o olhou em desespero. Ele se levantou e seu corpo começou a tremer... De repente, grandes patas de insetos brotaram de seu tórax... Ele entregue a aberração, sentiu seu corpo se rasgar e um gigantesco inseto peludo sair de dentro de si. César munido com a espingarda, olhou os outros insetos lhe cercar... Carla o puxou pelo braço para seguirem para fora da casa e do quintal...


Sairão esmagando e sendo alvejados por insetos... César abandonou a espingarda e sentiu um ferrão grande lhe vara as costas... Próxima ao portão, Carla parou de correr e tentou ajuda-lo... O grande inseto lhe trouxe até ele com o ferrão de seu abdome e devorou sua cabeça... Carla lamentou e em desespero tentou correr... Caiu no chão e milhares de insetos a cobriram... Ela se arrastava até o portão, arrancando forças para fugir de todo aquele inferno. O inseto gigante corria com suas seis patas em direção a ela, que se arrastava cada vez mais próxima de sua liberdade...

Quando chegou na calçada, os insetos que a cobriam caíram secos no chão... Carla se levantou vitoriosa e viu o inseto selvagem grunhir de ódio... A sala vazia começou a queimar leve... O fogo se espalhou avassalador e logo tomou conta de tudo... Carla viu o fogo correr o quintal e o inseto gritante agonizar nas labaredas insanas... Parecia que o próprio inferno devorava voraz a propriedade...

Carla se ajoelhou diante as chamas e sorriu em comemoração, por ter sobrevivido a toda aquela desgraça.


8 Meses Depois

Na feira de livros, Carla autografava orgulhosa os exemplares dos leitores. Olhou seu nome na capa, logo acima do título: “A Casa dos Medos”. Sorriu e se lembrou de todo o passado, detalhado em ficção.

Enquanto palestrava a pequena multidão de fãs, viu de cima do palco um menino com o pescoço enfaixado. Tentou ignorar aquela imagem, mas não conseguia. Quando terminou o menino se foi junto com os outros.

Abriu sua bolsa e arrancou calmantes de lá... Estava só na grande sala, quando sentiu o vento bater.... Não tinha janelas abertas e ela lamentou. Olhou para trás e deu de frente com o garoto, com o escapulário no pescoço e a grande faca na mão esquerda. A faca correu até sua barriga, ele a consolou em seu pequeno ombro e disse a seu ouvido:

Feche os olhos meu amor... Tudo ficará bem, eu te prometo...